domingo, 22 de março de 2020

Duas ou três gotículas


Duas ou três gotículas
 
Praça Edmundo Bitencourt, mais conhecida como Bairro Peixoto
Fevereiro de 2019, após chuvas que derrubaram mais de 400 árvores na cidade
Foto de celular Nokia 5
Copacabana, Rio de Janeiro

Porto, 21 de março de 2020
Duas ou três gotículas
Celso DL

Foram precisas, duas, três gotículas…
Imperceptíveis respingos
Um salpicar desprezível ao olhar
Borrifar contaminado pela vontade de persistir

Invisível vida, impalpável força
Cuja dimensão de seu vigor
Desarmou a todos
Donos do poder, exércitos, súditos, mentes brilhantes, desatentos…  

Foram precisas, duas, três gotículas
Incansáveis, minúsculos borrifos
Para mexer com a certeza de uma ordem
E a convicção, de toda uma organização de civilizações

Estrutura que diante dessa fria incerteza
Viu tremer suas bases
Numa progressão exponencial
A desconstruir os símbolos de uma era!

Um fluxo que deixou desmoralizada a logica que define tantas regras
As leis, as obrigações, os direitos, os acordos internacionais
Os valores morais, a ética de um povo, sua empatia, seu egoísmo
Seus costumes, aquilo que se pode ser e que se deve ter

Aquele que sairá vencedor, o outro que tudo irá perder
A roupa certa para vestir, o linguajar adequado, a etiqueta
Os ritos sociais entre pares, os protocolos entre irmãos
A hipocrisia do sorriso formal, a mentira oficial

A descoberta da fragilidade, diante de uma invisível partícula
Que chacoalhou essa intocável estrutura que a todos governa
E a fez estremecer de medo
Por pouco saber do próximo imprevisível ato

Desse ir e vir não autorizado
Que na rebeldia de prosseguir sua jornada de vírus
Segue destruindo vidas, sistemas e convicções
Pela via de duas, ou três gotículas