Feira do livro do Porto, quando ainda no pavilhão Rosa Mota
Trecho do conto Mestra e Sala
Lembrou-se da mania do pai de matar moscas na hora das refeições. Na época, ainda criança, assistia-o persegui-las com determinação, sempre que sobrevoavam a mesa. Sua mãe nunca se habituou à mania do marido, que, além dessa obsessão, tinha o hábito de guardar as moscas mortas numa caixa de sapatos.
Suas práticas esquisitas iam além. Costumava juntar moscas vivas em recipientes de vidro para observá-las, enquanto fazia as refeições, momentos em que seu espírito incontrolável encontrava alguma paz. Em transe e fascinado, observava as moscas prisioneiras batendo no lado interno do recipiente, tentando, repetidamente, sair voando.
A mãe de Suzana aprendeu a se conter. Retraindo-se, aceitava o vício do marido à base de muitos calmantes que se habituara a ingerir. Suzana desenvolveu asco do pai e pena da mãe, e ganhou o hábito de matar moscas como o pai e ingerir pílulas como a mãe.
A história dos pais de Suzana foi manchete nos jornais. Sua mãe morreu em decorrência da falência do coração devido à mistura de medicamentos. A notoriedade da notícia não foi pela morte propriamente dita, mas pelo que se descobriu na visita do médico legista. Ao derrubar algumas das muitas caixas de sapatos empilhadas ao redor da cama, viu a estranha coleção de milhares de moscas guardadas no quarto do casal. Foi essa história bizarra que circulou nos principais jornais e chocou a população carioca. O resultado de tanta polêmica fora a internação do pai de Suzana num hospital psiquiátrico do município, onde se encontra até hoje. Ficou conhecido como O Colecionador.